martes, 1 de diciembre de 2020

A circulação da moeda espanhola no Brasil

 Publicado en Revista Numismática Brasileira, - Vol. XXIV, No 2,  2020

https://www.academia.edu/44613736/A_circula%C3%A7%C3%A3o_da_moeda_espanhola_no_Brasil

Durante a colônia, o Brasil tinha falta de moedas para pagamento, enquanto no restante das Américas já havia cunhagem em várias Casas da Moeda. Emissões de carimbos sobre moedas espanholas ocorrem desde o século XVI, autorizando estas moedas carimbadas circularem no território colonial, pelo governo português. Além dos carimbos em ocasiões diversas da colônia, também no século XIX e em insurgências no Rio Grande do Sul, cortando e carimbando com valores para circulação local ocorreram.

 A escassez de moeda própria no Brasil obrigou as autoridades portuguesas autorizar a circulação da moeda espanhola no território. Segundo Beltrán, a cunhagem de moedas no Brasil foi tardia, pelo que se recorreu a usar uma taxa de câmbio direto e o uso de moedas das Índias espanholas ou metropolitanas, com carimbo não só para autorizar, mas para elevar o valor. Segundo Torres, é possível que já desde a metade do século XVI, mais de 20 casas de fundição das que se tem notícia carimbaram ou marcaram moeda indiana espanhola, ou mesmo bateram seu próprio numerário, dado que se conservaram exemplares e existem alguns indícios documentais.

 Já em data posterior como no começo do século XVII, começaram a carimbar moedas espanholas em circulação, constando o valor em réis. Existem carimbos com reais nas moedas de 1, 2, de 4 e de 8 reales, com uma coroa bem simples e os números 60, 140, 240 e 480, respectivamente. Em 1643, como afirma Foster, as moedas de 4 reales valiam 240 réis, e em 1663, 300 réis.

 João IV autorizou em 1643 a circulação dos 8 reales, que se conheciam como patacas, e as moedas de 4 reales como meia patacas, carimbadas com a coroa real portuguesa e com indicação do valor em réis, como indicado antes. Os carimbos foram feitos em Salvador, na Bahia, Rio de Janeiro e Maranhão. A princípio, cada real indiano era valorizado em 20 vinténs ou 40 réis.

 No Brasil também ocorreram problemas resultantes dos escândalos de Potosí, e em 1647 e 1651 foi proibida a circulação das moedas do Gran Peru, embora se permitisse bater as moedas da Casa da moeda do México e as cunhadas na península Ibérica em Sevilla e Segóvia, e em 1655 retomaram a autorização de carimbar as moedas peruanas com novo cunho e desenho.

 Outra vez em 1670 se carimbaram as moedas espanholas em circulação, com um anagrama com coroa e os números 75, 150, 300 e 600, que representavam os valores em réis sobre as moedas de 1 real, de 2, de 4 e os pesos. Apenas 5 anos após fizerem novos carimbos para adequar a moeda espanhola aos novos valores, com os números 80, 160, 320 e 640 réis. Mas em 1680 também se carimbaram os 4 reales e os pesos com 300 e 500 dentro de um quadrado coroado, e outro carimbo com uma esfera armilar coroada.

 Desde o final no século XVII descobriu-se ouro no território, e uma parte passou aos territórios indianos da Espanha em troca de prata e outras mercadorias. Como afirmam Martin de Souza e Valério, os principais produtos das Índias de ambas coroas, como algodão, carnes, açúcar ou tabaco eram similares, embora o Brasil fosse um importante ponto para a introdução das mercadorias europeias de contrabando. Embora a moeda de outro não tivesse circulação legal no Brasil, o metal circulava no território, e eram comuns as joias e ornamentos religiosos fabricados neste metal, devido a que era abundante e barato. O Ponto principal da entrada nos territórios era o Estuário do Prata.

 Humboldt conta que o Brasil era um receptador da maior parte da prata de contrabando que saia do Vice-reino do Peru. Este comércio ilícito se produzia a leste dos Andes, pela bacia do Amazonas. A seu entender, para a prata do Vice- -reino Meridional, Brasil era um mercado quase tão lucrativo como era a China para o Setentrional. Entre 1/5 e ¼ da produção das minas de Pasco e as de Chota havia seguido este caminho. Por esta via havia saído contrabando, segundo seus cálculos, 200 milhões de pesos desde o descobrimento até 1803.

 O volume do tráfico fazia com que algumas pessoas em Lima, segundo este autor, pensassem que melhorasse o comércio por esta via fluvial seria maior a exportação fraudulenta de prata. Isso foi uma rêmora para o desenvolvimento econômico das províncias amazônicas do Vice-reino que eram banhadas pelos rios Guallaga, Ucayalo, Bei e Puruz, agora conhecidos como Huallaga, Ucayali, Beni e Purús, embora a falta de povoamento tivesse facilitado enormemente as atividades dos contrabandistas.

 A partir de 1808 houve a autorização de novo carimbo nas moedas de 8 reales espanhóis, dando o valor de 960 réis. Este valor, como escfreve Santos, era fixado em Minas Gerais e Mato Grosso. Na data de 1º de setembro deste ano se autorizou por Alvará, o carimbo dos pesos das casas da moeda indianas, aplicando-se o carimbo bifacial com o escudo de Minas Gerais e o globo do Brasil, sendo que o facial se aplicava notavelmente superior ao valor da prata. Montaner aponta outros carimbos regionais em Mato Grasso, em 1818, em Cuiabá, entre 182 e 1821, no Ceará e em Piratini em 1834, como logo veremos até 1835.

 Blair afirmava que entre 1819 e 1816, a moeda de prata circulante no Brasil era composta exclusivamente por moedas de 8 reales espanhóis recunhados, o que permitia ver os desenhos originais ao se examinar detalhadamente as moedas. Eckefeldt e Du Bois escrevem que as emissões de 960 réis de valor facial cunhados estes anos eram “simplesmente dólares espanhóis em nova roupa”.

 Esta autorização coincidiu cronologicamente com a fundação do Banco do Brasil, e com a autorização da circulação dos vales emitidos pelas Reais Casas de Fundição do Ouro da Capitania das Minas gerais, cujo excesso de emissão produziu a descrença em 80%. Como afirmaram Eckfeldt e Du Bois, com a criação de novas moedas em 1833, com os valores de 1.200, 800, 400, 200 e 100 réis, que ao menos nominalmente estavam cunhadas de acordo com o padrão espanhol, de fineza da prata, e o circulante brasileiro era composto basicamente de papel moeda.

 Durante a conhecida Revolução Farroupilha, ou Guerra dos Farrapos, entre 835 e 1845, liderada pela classe dominante gaúcha, do Rio Grande do Sul, e na qual participou, ao final o herói da Unificação Italiana, Giuseppe Garibaldi, fizeram uma circulação monetária no território, incluindo a espanhola. Dentre estas moedas carimbadas se destacam as balastracas, moeda cortada, geralmente de prata peruana ou potosina, com valores de 100, 200 3 400 réis. A moeda corta tinha formatos irregulares, com a linha de corte lisa, dentada ou ondulada, e se utilizava para cobrir as necessidades da moeda fracionada.

 Referências

BELTRÁN MARTÍNEZ, A., Introducción a la Numismática universal, Madrid, 1987.

BLAIR, E.H., The Philippine Islands 1493-1898, Vol. LI, 1801-1840.

ECKFELDT, J.R., DU BOIS, W.E., A manual of gold and silver coins of all nations, stuck within the past century, Philadelphia, 1842.

FOERSTER, G.H., “Plata hispanoamericana en circulación mundial del siglo XVI hasta el siglo XX. Monedas de una exposición numismática”, Gaceta Numismática 141, junio 2001, pp. 41-59. FOERSTER, G.H., “Un “Rarolus” de Santiago de 1796”, Crónica Numismática, diciembre 2005, p. 48.

HUMBOLDT, A. von, Ensayo Político sobre la Nueva España, T.III, Paris, 1827

MARTINS DE SOUSA, R. y VALÉRIO, N., “Portuguese prices and Brazilian gold in the 18th century”, 13th International Economic History Congress on “Global Moneys and Price Histories, 16-18 Centuries”, Buenos Aires, 2002.

 McCLELLAN, L., “Two-bits, four-bits, six-bits, eight...” www.columnarios.com, 15 Jun 2008. MONTANER AMORÓS, J., Los resellos. Las monedas españolas reselladas en el mundo, Valencia, 1999.

SANTOS, R.E., “El desarrollo monetario anglosajón en Brasil (1801-1822)”, Crónica Numismática, abril 2001, pp. 55-59.

TORRES, J., “La implantación de la moneda en América”, Revista de Filología Románica, 11-12, UCM, 1994-95.

VICTORINO, Y., A Moeda da Revolução Farroupilha, Fundo da gaveta do Yuri

“Piezas de 960 reis de Juan VI del Brasil sobre duros españoles”, NVMISMA, nº 23, noviembre - diciembre 1956, pp. 179-180.

 

Publicado originariamente y en castellano en Numismático Digital, 9 de abril de 2015.

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